Influência da abertura lateral do forame apical e do tamanho da lima na instrumentação do canal cimentício

Influência da abertura lateral do forame apical e do tamanho da lima na instrumentação do canal cimentício

Ronaldo Araújo SouzaI; Yara T. Corrêa Silva SousaI; José Antônio Poli de FigueiredoII; João da Costa Pinto DantasIII; Suely ColomboIII; Jesus Djalma PécoraIV

Escola de Odontologia, Universidade de Ribeirão Preto, Ribeirão Preto, SP, Brasil
IIPUC – Pontifícia Universidade Católica, Porto Alegre, RS, Brasil
IIIDpartamento de Endodontia, Escola de Odontologia, EBMSP – Escola Bahiana de Medicina e Saúde Pública, Salvador, BA, Brasil
IVRibeirão Preto Escola de Odontologia, USP – Universidade de São Paulo, Ribeirão Preto, SP, Brasil

Correspondência

ABSTRACT

Uma vez que a instrumentação do forame apical foi sugerida para limpeza e desinfecção do canal cimentício, a seleção do tamanho do arquivo e da posição do forame apical tem passos desafiadores. Este estudo analisou a influência que a abertura lateral do forame apical e o tamanho da lima pode exercer sobre a instrumentação do canal cimentício. Trinta e quatro incisivos centrais maxilares humanos foram divididos em dois grupos: Grupo 1 (n=17), sem queima, e Grupo 2 (n=17), com queima com brocas LA Axxess. Ficheiros K de diâmetros crescentes foram progressivamente inseridos no canal até que fosse alcançada a ligação no forame apical e as pontas fossem visíveis e coladas com adesivo etil cianoacrilato. O conjunto telhados/files foram seccionados a 5 mm do ápice. Os apices foram examinados por microscopia eletrônica de varredura em ×140 e as imagens digitais foram capturadas. Os dados foram analisados estatisticamente pelo teste t de Student e pelo teste exato de Fishers a 5% de significância. As micrografias SEM mostraram que 19 (56%) foramina apical surgiram lateralmente ao ápice da raiz, enquanto 15 (44%) coincidiram com o mesmo. No grupo 2 foi observada uma dificuldade significativamente maior para alcançar o forame apical. Results suggest that the larger the foraminal file size, the more difficult the apical foramen instrumentation may be in laterally emerged cemental canals.

KeyWords: Apical foramen, coronal preflaring, endodontic files, maxillary central incisor.

RESUMO

Tendo em vista que a instrumentação do forame apical tem sido sugerida para a limpeza e desinfecção do canal cementário, a seleção do calibre do instrumento e a posição do forame apical representam passos desafiantes. Este estudo analisou a influência que a saída lateral do forame apical e o calibre do instrumento podem exercer na instrumentação do canal cementário. Trinta e quatro incisivos centrais superiores foram divididos em dois grupos: Grupo 1 (n=17), sem preparo cervical, e Grupo 2 (n=17), com preparo cervical com brocas LA Axxess. Limas K com aumentos de diâmetro foram progressivamente inseridas no canal até ajustar no forame apical e as pontas ficarem visíveis e foram fixadas com adesivo de etil cianoacrilato. Os conjuntos raízes/limas foram seccionados transversalmente a 5 mm aquém do ápice. Os ápices foram examinados por microscopia eletrônica de varredura com aumento de 140x e imagens digitais foram capturadas. Os dados foram examinados estatisticamente pelo teste t de Student e teste exato de Fischer com nível de significância de 5%. A microscopia eletrônica de varredura mostrou que 19 (56%) dos forames apicais saíram lateralmente em relação ao ápice radicular, enquanto que 15 (44%) coincidiram com ele. Dificuldade significantemente maior para chegar ao forame apical foi observada no Grupo 2. Os resultados sugerem que quanto mais calibroso for o instrumento foraminal, mais difícil poderá ser a instrumentação do forame apical em canais cementários que apresentam saída lateral.

INTRODUCTION

Loss of 1 mm of the working length increases the failure rate by 14% in teeth with periapical lesions (1). Além disso, um comprimento de trabalho com mais de 2 mm do ápice representa uma redução de 20% na taxa de sucesso quando as lesões periapicais estão presentes (2). Isso pode ser explicado pela presença de microorganismos nas porções apicais do canal e sua participação no desenvolvimento das lesões periapicais (3,4).

O sucesso do tratamento endodôntico depende da erradicação dos microrganismos do sistema radicular e da prevenção da reinfecção (5). Para tal, parece razoável supor que a instrumentação deve ser feita em toda a extensão do canal, incluindo a porção de cemento, além da constrição apical (6-8).

A limpeza do canal cimentício com um pequeno diâmetro de arquivo K inserido passivamente através da constrição apical (9) foi questionada por Souza (8) e Hülsmann e Schäfer (10). O alargamento do forame apical demonstrou ser mais favorável à cicatrização de lesões periapicais crônicas (11) e deve ser realizado com uma lima que se enquadre estreitamente na constrição do canal e seja seguida pelas duas seguintes do seu tipo em série e tamanho (12).

Os incisivos centrais maxilares geralmente possuem canais largos, exigindo o uso de limas grandes. Por outro lado, a análise da anatomia apical desses dentes mostra que o forame apical freqüentemente emerge lateralmente ao ápice (13-16).

Considerando que as limas de grande diâmetro apresentam flexibilidade limitada, é possível que ambos os aspectos, instrumentos com grandes diâmetros e abertura lateral do forame apical, apresentem alguns desafios no alargamento do forame apical.

O objetivo do presente trabalho foi avaliar a influência que a abertura lateral do forame apical e o tamanho da lima pode exercer sobre a instrumentação do canal cimentício nos incisivos centrais superiores.

MATERIAL E MÉTODOS

Trinta e quatro incisivos centrais superiores humanos com raízes totalmente desenvolvidas do banco de dentes da Faculdade de Odontologia da Faculdade de Medicina e Saúde Pública da Bahiana foram utilizados para esse estudo. Os critérios adotados para a seleção dos dentes foram ausência de anatomia externa complexa, curvatura acentuada, formação radicular incompleta e reabsorção apical, determinada pelo exame direto e radiografias periapicais. Um operador realizou todos os procedimentos experimentais.

Acesso e preparo da câmara de polpa foram realizados com uma broca redonda de carboneto #3 (KG Sorensen, Cotia, SP, Brasil) e broca Endo-Z (Maillefer, Ballaigues, Suíça).

Após irrigação com 1 mL 2,5% NaOCl, os canais radiculares foram explorados com um arquivo tamanho 15 K (FKG Dentaire, La-Chaux-de-Fonds, Suíça), inseridos manualmente até que o forame apical fosse alcançado e a ponta do arquivo fosse visível. Assim, o comprimento do canal foi determinado para todos os dentes.

Os dentes foram divididos aleatoriamente em dois grupos. No grupo 1 (n=17), os canais foram irrigados com 1 mL de NaOCl 2,5% e os arquivos K (FKG Dentaire) de diâmetros progressivamente crescentes foram inseridos suavemente no canal com movimento recíproco até que a ligação no forame apical e sua ponta fosse visível. O diâmetro deste instrumento foi registado e foi colado com adesivo de cianoacrilato de etilo. O conjunto telhados/files foram cortados a 5 mm do ápice.

No Grupo 2 (n=17), a queima coronal foi realizada com brocas 20/0.06 e 35/0.06 LA Axxess (SybronEndo, Glendora, CA, EUA), acopladas a um motor endodôntico de torque Endo-Pro (Driller, Jaguaré, ES, Brasil) a 3,5 N-cm de torque e 6.000 rpm. As brocas foram inseridas até 4 mm abaixo do ápice e os canais foram irrigados com 1 mL de NaOCl 2,5% a cada troca de instrumento. Uma seringa de impressão de 5 mL e ponta capilar (Ultradent Products Inc., South Jordan, UT, EUA) foram utilizadas para a irrigação em ambos os grupos.

Após a queima coronal, um arquivo de tamanho 15 K como reintroduzido até o forame apical para restabelecer a patência e arquivos K de diâmetros progressivamente crescentes foram inseridos suavemente no canal com movimento recíproco até que a ligação no forame apical e sua ponta fosse visível. O diâmetro deste instrumento foi registado e foi colado com adesivo de cianoacrilato de etilo. O conjunto telhados/files foram cortados a 5 mm do ápice.

As raízes de ambos os grupos foram fixadas em tocos e salpicos de ouro como previamente relatado (17) e um microscópio electrónico de varrimento Philips XL-30 (Philips, Eindhoven, Netherland) foi usado para examinar os apices com ampliação de ×140. As imagens foram capturadas digitalmente e os dados foram analisados estatisticamente através do teste t de Student e do teste exato de Fisher. Um nível de significância de 5% foi definido para todas as análises.

RESULTADOS

O tamanho médio dos arquivos em cada grupo, assim como os desvios padrão, valores mínimo e máximo e as medianas são mostrados na Tabela 1.

Os valores médios dos tamanhos dos arquivos foram submetidos ao teste t de Student e foram observadas diferenças estatisticamente significativas entre os grupos (p=0). O tamanho médio das limas foraminais (ou seja, as que se limitaram ao canal cimentício) foi maior no Grupo 2 (com queima), conforme demonstrado na Tabela 2. As diferenças de taxa para cada tamanho de arquivo foram testadas pelo teste exato de Fisher. A diferença estatisticamente significativa (p=0,047) foi observada entre os tamanhos de 30 e 35 limas no Grupo 1, quando comparados com o Grupo 2. Para os demais tamanhos de arquivo, não foi observada diferença significativa entre os grupos.

A análise das micrografias SEM mostrou que 19 (56%) foramina apical emergiram lateralmente ao ápice radicular (Fig. 1A), enquanto 15 (44%) coincidiram com ele (Fig. 1B). No grupo 2 houve maior dificuldade ao tentar inserir arquivos até o forame apical de alguns canais, especialmente naqueles com raízes levemente curvadas (Fig. 2A e 2B).

DISCUSSÃO

Além de contribuir para a determinação mais precisa do diâmetro apical real (18,19), outro objetivo da queima de acesso é facilitar a penetração das limas e a instrumentação do terço apical do canal. Assim, a queima coronal também deve facilitar a penetração da lima até o forame apical.

Ao reduzir as interferências nos terços cervical e médio, a queima permitiu a fixação de limas maiores no forame apical do grupo 2, como mostrado nas Tabelas 1 e 2. No entanto, neste grupo encontramos mais dificuldades para inserir limas até o forame apical de alguns canais, particularmente naqueles com raízes ligeiramente curvas (Figs. 2A e 2B). Em raízes retas, estas dificuldades foram menos significativas.

A necessidade de alargamento do canal radicular não se justifica apenas por razões mecânicas (de moldagem). Existe também uma razão biológica (de limpeza) (20,21). O sucesso do tratamento endodôntico depende da erradicação dos micróbios do sistema radicanal (5) e o desbridamento do canal radicular por instrumentação e irrigação é considerado o mais importante fator único na prevenção e tratamento das doenças endodônticas (22). Assim, como na porção dentinal do canal, a instrumentação do canal cimentício deve ser considerada.

O alargamento do forame apical é mais favorável à cura de lesões periapicais crônicas (11), pois há mais chances de erradicar microorganismos do canal radicular, particularmente os do canal cimentício, e promover o controle das infecções.

Butler (12) estabeleceram que o forame apical deve ser instrumentado com uma lima que se encaixe perfeitamente na constrição do canal e seja seguido pelos dois seguintes do seu tipo em série e tamanho, enquanto Souza et al. (23) observaram que para um relacionamento adequado seriam necessários 4 instrumentos além da lima do forame apical. No entanto, esta não é apenas uma questão microbiológica, mas também uma questão anatômica. Em vista dos tamanhos das limas (Tabelas 1 e 2) e da alta freqüência de abertura lateral do forame apical, corroborada por outros autores (13-16), o alargamento do forame apical em alguns dentes, como os incisivos centrais superiores, pode ser difícil.

Os instrumentos de grande diâmetro são menos flexíveis e, portanto, mais difíceis de dobrar antes da inserção dos forames apicais que se abrem lateralmente. É possível que nestas situações a pressão aplicada durante a inserção das limas no forame apical induza alterações na sua configuração anatómica. Apesar da necessidade de ampliação para melhor controle de infecção, a instrumentação com limas maiores pode representar um desafio no forame lateralmente emergente.

Em vista disto, pode-se recomendar a penetração inicial até o forame a ser realizado com limas menores, que são capazes de alcançar o forame sem aplicar pressão excessiva. Em uma etapa posterior, podem ser utilizados arquivos de tamanho maior. No entanto, outras alternativas seriam o uso de instrumentos mais flexíveis, como limas de níquel-titânio (NiTi), limas ajustadas em segurança (SAF) (23), ou o desenvolvimento de instrumentos apropriados para este fim.

Os resultados atuais demonstram que quanto maior o tamanho da lima do forame, mais difícil poderá ser a instrumentação do forame apical nos canais radiculares emergirem lateralmente. Outros estudos com foco neste tópico devem ser conduzidos, incluindo outros grupos de dentes.

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